terça-feira, 11 de setembro de 2012

Por baixo do tapete.


HUGO CHÁVEZ COMBATE O 'PROBLEMA' DA CRIMINALIDADE OCULTANDO-O

POR FRANCISCO VIANNA
(com base na mídia internacional)

Um menino contempla como o corpo de um de seus familiares é colocado no féretro de uma funerária (o negócio do momento na Venezuela) do populoso bairro de Petare, em Caracas,
imagem: JUAN BARRETO/AFP

Um jovem recém-formado sai de sua casa num bairro pobre de Caracas, na Venezuela e, diante dos olhos de sua mãe é morto a tiros por delinquentes que queriam apenas lhe roubar o telefone celular. Esses e outros dramas que vive o povo venezuelano são os maiores promotores da campanha do candidato oposicionista Henrique Capriles, que, no entanto, não exibe todo o sangue que corre hoje pela altíssima criminalidade do país, uma vez que mostrar homicidas ou as vítimas que caem sem vida por meio de tiros foi terminantemente proibido pelas autoridades eleitorais do país. 

Tudo porque o alto índice de criminalidade na Venezuela se converteu num dos temas que mais vulneram o governo de Hugo Chávez em seus esforços para conseguir seu terceiro mandato presidencial nas eleições de 7 de outubro próximo. O crime é tanto que as ruas, mesmo durante o dia, apresentam um movimento muito menor do que tinham há alguns meses. Durante a noite, então, elas ficam totalmente desertas. 

A insegurança pessoal é o maior motivo de preocupação dos venezuelanos, que são vítimas de uma das mais elevadas taxas de homicídios do planeta, diante da incapacidade de seu governo ‘socialista’ de dar ao problema um tratamento adequado e uma solução legal dentro do que ainda resta de democracia no país. A solução, então, encontrada pelo socialismo bolivariano de Hugo Chávez Frías é a de esconder o problema, impedindo que a mídia publique sua descrição e, muito mais, que exiba fotos mostrando bandidos, assassinos e vítimas. 

O partido de oposição, chamado “Vontade Popular” diz que o governo “tenta tapar o sol com uma peneira” e que não é preciso ver as fotos e os filmes chocantes nos jornais e na TV para saber que eles estão acontecendo de forma rampante no país, e que acabam circulando na Internet, uma mídia que Chávez ainda não conseguiu censurar de modo eficaz. 

Os internautas acabam fazendo involuntariamente uma campanha a favor de Capriles ao exibir tais matérias, enquanto o governo procura levar adiante uma “campanha interna para tentar convencer as pessoas de que devem se acostumar a isso”. Elementos do governo, de um modo geral, não negam o problema da insegurança, mas todos eles repetem, como mantra, que “isso não vai mudar em nada e que ninguém pode mudar essa situação”, ou seja, o “socialismo do século XXI”, por sua competência em lidar com o problema, tenta convencer as pessoas que ninguém – muito menos Capriles – poderá combatê-lo e erradicá-lo. Mas a gravidade desse problema está piorando e põe em maior risco os que têm menos condições de se defender. Não é difícil para a oposição mostrar que “estatisticamente está comprovado que nestes últimos 14 anos, cada ano passado tem sido seguido de outro bem mais violento. Já são mais de 150 mil mortos nos últimos 14 anos”. Muito mais baixas do que todas das guerras do Oriente Médio somadas. 

A coisa hoje ocorre na base explosiva de 54 assassinatos diários, o que significam uma taxa de mais de 67 homicídios por cada 100 mil habitantes, proporção duas vezes e meia mais alta que no Brasil, e três vezes a do México – países conhecidos pela impunidade e benevolência de seus governos com o crime – e segundo os dados do Observatório Venezuelano da Violência. 

Além do homicídio, crimes como sequestro e assalto a mão armada também tem aumentado, e umas 480 mil pessoas já foram feridas ou sofreram dano físico e psicológico por esses delitos violentos. Apesar dos esforços governamentais em esconder a verdade, a periculosidade das ruas não passa despercebida pelas mentes dos venezuelanos. A maioria das enquetes de opinião feitas no país coloca a insegurança pessoal como o principal tema de preocupação para eles. 

Um estudo publicado recentemente pelo Gallup assegurou que dois de cada três venezuelanos convivem com o medo e evitam sair à noite sob o temor de serem assaltados, roubados, sequestrados, ou mesmo de perder a vida, percepção que é a mais alta em toda a América Latina e a terceira maior do mundo, somente superada pela do Chade e do Afeganistão, países que passam por turbulentas épocas de violência política. É um cenário que foi ilustrado no comercial de 30 segundos da TV elaborado em favor de Capriles por uma ONG que se chama "Cidadania Ativa". 

Na verdade, essa ONG – assim como outros setores da sociedade que já começam a falar mais diretamente do problema – quis demonstrar que a violência não é um assunto de números apenas, uma vez que tais números não refletem, por exemplo, barris de petróleo ou cabeças de gado, mas são números estatísticos frios que mostram a situação das famílias venezuelanas que numa proporção desmesurada estão sendo vítimas desta grande tragédia nacional que tem sido o chamado ‘socialismo bolivariano’. 

O palácio Miraflores se assustou e mandou que o programa fosse tirado do ar. A ordem de retirar o comercial veio do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), que praticamente faz o que o governo quer, sob o argumento de que o seu conteúdo ‘violava as normas eleitorais do país, ao fazer uso de menores de idade, de empregar cores de outras organizações políticas, e de tentar contra a “saúde mental dos venezuelanos”. Não é piada não... 

Segundo os comentários oposicionistas as duas primeiras alegações não puderam ser entendidas pela oposição, haja vista que o suposto menor de idade era de fato um ator de 28 anos e porque o argumento que qualificava como “cor de outros partidos” era o uso de uma canção que efetivamente faz parte da campanha de Chávez. Sobre o terceiro ponto, a oposição diz – e com uma razão cristalina – que a mensagem da oposição faz muito menos mal à saúde dos venezuelanos do que a realidade que enfrentam quando saem de casa. “O que verdadeiramente atenta contra a saúde mental de um povo é ter um governo que, ao não exercer uma verdadeira vontade política para combater a criminalidade, não permite que os venezuelanos saiam de suas casas com uma mínima certeza de que voltarão vivos para dormir em suas camas. Isso, sim, atenta realmente contra a saúde psíquica de qualquer um”, sustentou um membro oposicionista. 

Infelizmente, a Venezuela, que já foi um promissor país da América do Sul, se encontra em franca queda livre e, caso ocorra o milagre de Capriles vencer as eleições – e ser empossado no cargo, o que faz uma grande diferença – terá anos pela frente para tentar consertar o dano feito por Hugo Chávez ao seu país e colocá-lo, de novo, na trilha do progresso e do desenvolvimento. 

Que Deus se apiede dos venezuelanos. 

NOTA DO AUTOR – Cuidei de enviar o artigo acima para minha amiga Beatriz W. de Rittigstein, jornalista e articulista venezuelana que escreve para o jornal El Universal, antes de publicá-lo, a qual me escreveu o seguinte: “É isso aí, sem tirar nem por, o que enfrentamos todos os dias aqui na Venezuela. Vivemos com medo”. “Por outro lado, penso que Capriles, de fato, tem os votos para poder ganhar de Chávez. Obviamente, é difícil lutar contra o abuso de poder e o ‘vantagismo’, mas Capriles está a fazer uma excelente campanha. Certamente, necessitamos da ajuda de Deus”. Beatriz. 

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