quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Contrabando ou provocação?

À esquerda, o navio norte-coreano ‘Chong Chon Gang’ foi detido no Panamá depois de esconder um carregamento de armas procedente de Cuba. Agora, outro barco norte-coreano, o ‘Mu Du Bong’ encalhou em Tuxpan depois de zarpar de Havana. (Fotos: AFP/Getty Images)
As autoridades detalharam uma operação de contrabando de cubanos durante a qual morreram 11 pessoas por cólera em Camagüey, Cuba, dando início ao atual apoio da Rússia a três norte-coreanos absolvidos no Panamá no caso das armas cubanas e que viajaram de volta a Piongyang.
Um cargueiro norte-coreano encalhou no Golfo do México poucos dias depois de fazer uma parada em Havana, um acidente que levantou inevitáveis comparações com outra embarcação de Pyongyang capturada no verão passado com um carregamento ilegal de armas cubanas.
O ‘Mu Du Bong’, com 430 pés de comprimento, encalhou na manhã de hoje, segunda feira, num recife a cerca de sete milhas do porto mexicano de Tuxpan, segundo alguns diretores da indústria da marinha de cabotagem. “O trabalho de desencalhe do recife será complicado e levará vários dias para terminar”, disseram.
O barco navegava vazio e planejava carregar em Tuxpan quando encalhou porque o capitão “ficou desorientado”, conforme uma reportagem da Agência de Notícias ‘France Presse’. O porto de Tuxpan é conhecido como um dos principais portos exportadores de açúcar, no México.
Os administradores do porto disseram que “não sabiam se o Mu Du Bong estava entrando ou saindo do porto”. Um agente do escritório da Capitania dos Portos mexicana declarou que ninguém estava autorizado a dar qualquer informação sobre o caso. Np entanto, surgiram logo especulações sobre o cargueiro, que começaram, inclusive, antes do acidente, porque sua viagem era similar à do ‘Chong Chon Gang’, confiscado pelas autoridades panamenhas em julho do ano passado e no qual foram encontradas, escondidas sob uma carga de açúcar algo em torno de 240 toneladas de armamento cubano.
Ambos os cargueiros navegaram em águas cubanas, mas sua localização exata foi um mistério por vários dias pelo fato de nça ter havido relatórios de seus indicadores automáticos de localização (GPS), exigidos pelos regulamentos internacionais de segurança. O ‘Chong ChonGang’ desligou seu GPS para ocultar sua localização, conforme a conclusão chegada pelas investigações que se seguiram à sua apreensão, feitas por agentes da ONU.
Já o ‘Mu Du Bong’ cruzou o Canal do Panamá rumo ao Caribe em 15 de junho último. Seu transponder indicou que em 25 de junho o navio estava próximo ao porto de Mariel, em Cuba, e em 29 e 30 de junho se encontrava no cais de Havana, conforme um artigo publicado no domingo seguinte pela revista FORBES, que foi a primeira em relatar sua travessia.
Durante os nove dias que se seguiram, seu transponder se manteve em silêncio (desligado), relatou a FORBES. Esse equipamento obrigatório começou a funcionar novamente em 10 de julho, mostrando que o navio estava em Havana, e em seguida zarpou com rumo a oeste para o Golfo do México, conforme descreveu a revista americana.
Um diretor da indústria de cabotagem chamou o cargueiro, construído em 1983, de “um velho ‘cacharro’ oxidado”, e disse que fotos da ponte do navio mostram um mastro estranho rodeado de cabos que bem pode ser algum tipo de grua improvisada ou uma antena de rádio para comunicação via satélite.
O responsável pelo website Liderança de Vigilância do Governo da Coreia do Norte (North KoreaLeadership Watch), Michael Madden, disse que nenhuma das duas possibilidades é de se estranhar porque “a improvisação é coisa corriqueira na Coreia do Norte, em particular nos casos em que precisa, mas não pode, adquirir materiais e equipamentos de maneira eficiente e normal nos mercados internacionais”.
Quanto à possibilidade de estar transportando ilegalmente armamentos de Cuba, há dúvidas, pelo fato de seus documentos de propriedade e carta náutica assinalarem grandes entidades que fabricam vários tipos de artigos civis, segundo Madden. Também é possível que um terceiro país haja contratado o navio para transportar carga de ou para Cuba.
A reportagem da FORBES afirma que os documentos de envio de mercadorias mostram que ambos os navios têm um mesmo agente comercial, a Empresa de Gerenciamento Oceano Marítima Ltda. (Ocean Maritime Management Company Ltd.). Especialistas que investigaram o incidente do ‘Chong Chon Gang’ disseram que a empresa “teve um papel chave na gestão do envio do carregamento oculto de armas e materiais relacionados”. Tais especialistas chegaram à conclusão que o carregamento cubano era uma violação do embargo de armas imposto pela ONU à Coreia do Norte em 2006 por causa de seus esforços em desenvolver armas nucleares e mísseis de longo alcance. Não foram impostas sanções a Havana.
As autoridades panamenhas interceptaram e apreenderam o ‘Chong Chon Gang’ em julho do ano passado, quando o navio se posicionava para cruzar o Canal do Panamá, em sua costa leste, após receber uma denúncia de que carregava drogas ilegais. No lugar da droga, encontraram as armas e outros equipamentos militares cubanos escondidas sob uma camada de sacos de açúcar.
O material militar apreendido incluía dois aviões MiG-21, 16 motores para esses MIGs, dois sistemas de radar e mísseis antiaéreos, assim como peças de artilharia e granadas autopropelidas. Cuba declarou que tinha enviado esses equipamentos “obsoletos” a Pyongyang para serem reparados e devolvidos, e argumentou que não tinha violado a proibição da ONU de “transferência” de armas a Pyongyang. A equipe de vistoria da ONU que examinou os documentos confiscados a bordo do cargueiro relatou que os papeis mostravam uma “minuciosa estratégia para ocultar” as armas. O carregamento militar não estava listado no manifesto de carga do navio, e em seu caderno de bússola náutica faltava o registro de vários dias.
O ‘Chong Chon Gang’ esteve atracado em Havana de 4 a 9 de junho para estivar sua carga, e em seguida cursou pela costa norte de Cuba até 20 de junho, quando atracou no Porto de Mariel e embarcou a carga militar proibida. Em seguida zarpou em 22 de junho com destino a Puerto Padre, na costa nordeste de Cuba, onde carregou o açúcar, e deixou as águas cubanas em 5 de julho com destino à Coreia do Norte.
O artigo da FORBES diz que “talvez tenha sido pouco provável que a Coreia do Norte tentasse de modo tão ostensivo outro contrabando tão próximo às costas dos Estados Unidos, tão pouco tempo depois do confisco da carga militar do Chong Chon Gang, mas, ao despachar o Mu DuBong para Cuba através do Canal do Panamá, Pyongyang estivesse no mínimo a provocar os EUA, e provavelmente tateando o terreno para futuras viagens de contrabando”.
Foi a segunda ida do Mu Du Bong a Cuba e a sexta visita norte-coreana ao país comunista do Caribe desde 2009, conforme dados do Projeto de Controle de Armas Nucleares Wisconsin (Wisconsin Project on Nuclear Arms Control).
O navio Po Thong Gang atracou em Havana e Santiago de Cuba durante uma visita em 2011, e em Puerto Padre em abril de 2012. O Oun Chong Nyon Ho atracou em Havana e Puerto Padre em maio de 2012.
O Panamá manteve detidos o navio e sua tripulação durante vários meses, para investigar as acusações de que não tinham relatado sua carga perigosa e proibida antes de cruzarem o Canal, rumo ao Pacífico. O cargueiro e 32 de seus tripulantes foram liberados em fevereiro último e seu capitão, bem como seu imediato, foi julgado e inocentado no início deste mês.

As autoridades panamenhas disseram ainda que entregarão o açúcar à Coreia do Norte, mas não as armas, porque Cuba nunca admitiu ser a proprietária do armamento perante a alfândega panamenha.
*FRANCISCO VIANNA (com mídia internacional)

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