terça-feira, 16 de agosto de 2016

Desdobramentos da Lava-Jato terão grande impacto nas urnas.


Envolvimento de políticos no esquema de desvios na Petrobras deve levar a um maior índice de votos brancos e nulos.

Brasília – A Operação Lava-Jato, desencadeada em março de 2014, vai influenciar diretamente, sobretudo nos grandes colégios eleitorais, as eleições municipais. Há dois anos, durante a corrida presidencial que reelegeu Dilma Rousseff (PT), os efeitos foram bem menores porque os investigadores ainda não tinham chegado diretamente ao chamado núcleo político do esquema. A conclusão é de cientistas políticos. Eles acreditam que, agora, a operação pode levar a um maior índice de votos brancos e nulos e até de abstenções por servir de combustível para potencializar um descrédito histórico na classe política brasileira. Apesar de envolver uma gama variada de partidos políticos, todos são enfáticos em apontar o PT como o maior prejudicado pelos efeitos das investigações.

O professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Calmon diz, porém, que é preciso levar em consideração as especificidades de cada disputa eleitoral. “Há uma dúvida, no entanto, em relação a essa influência no voto de cada eleição específica. Os efeitos, por exemplo, podem ser ignorados na disputa no Recife ou em Curitiba porque ambos os candidatos estão igualmente envolvidos, falando de maneira hipotética.”

Calmon acredita que a Lava-Jato será responsável por abrir uma grande oportunidade para grupos que contestam a estrutura política atual no país. “Obviamente, vai existir influência na medida em que boa parte da elite política brasileira está diretamente envolvida em episódios relacionados de alguma maneira à Lava-Jato. Seja envolvimento individual ou dos partidos, a população está influenciada por essa marca de desconfiança do sistema político e partidário. Afeta porque o prestígio dos partidos, e o político em geral, está abalado”, diz. Ele faz uma leitura de que haverá uma potencialização da descrença na classe política. “Acho que esse é um elemento que contribui para desinteresse e descrença em relação aos políticos. E isso, inegavelmente, fortalece a tendência das pessoas ignorarem a eleição. É muito ruim. Sobra para todos os partidos, mas o PT será o mais afetado.”

IMAGEM O doutor em ciência política pela UnB Leonardo Barreto avalia que o PT começou a pagar a conta da Lava-Jato antes mesmos das eleições. “A operação já influenciou, a começar pela mudança da Presidência da República. Agora, a expectativa é de que o candidato do PMDB ou apoiados pelo partido possam ter vantagem por ter acesso a recursos que não tinham antes”, diz. Ele analisa que o déficit de imagem do partido é grande e isso respinga em seus candidatos. “A consequência direta é a redução do PT, que terá um déficit de imagem importante, em algumas regiões mais e em outras menos. Uma quantidade grande de petistas deixou o partido. A sigla começou a pagar a conta mesmo antes de disputar o processo eleitoral”, avalia.

Barreto acrescenta que a Lava-Jato já produziu um fato importante para as eleições. “Uma inferência indireta é que os desdobramentos da operação são responsáveis por fazer o Supremo Tribunal Federal (STF) adotar postura contrária ao financiamento privado de campanha. É sem dúvida um filhote da Lava-Jato. A proibição do financiamento privado tem impacto grande nas eleições. Vai valorizar aqueles que tentam a reeleição por ter a máquina pública. Também valoriza os pastores e sindicalistas porque precisam de menos recursos”, declarou. O cientista político avalia a apatia do eleitorado diante de tantas denúncias contra políticos. “Não me surpreenderia se o número de brancos e nulos aumentasse. Já temos uma base de desconfiança muito forte. Você já tem consolidado um grau de abstenção e de votos brancos e nulos. É possível que se tenha um incremento, mas é difícil de estimar.”

Em 2006, os efeitos do mensalão não foram suficientes para impedir a reeleição do presidente Lula. A avaliação é de que a impressionante força política do petista, na época, e um governo muito bem avaliado reduziram a quase nada os desdobramentos do escândalo de compra de apoio parlamentar. Já os candidatos proporcionais em 2006 citados na Operação Sanguessuga amargaram derrotas políticas. Dos 64 deputados e três senadores que responderam a inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) e foram candidatos, a grande maioria passou longe do número necessário de votos para garantir o retorno. Apenas seis citados no caso conseguiram se eleger.

A investigação do núcleo político da Lava-Jato começou em março de 2015, quando o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, apresentou 28 petições ao STF para a abertura de inquéritos criminais destinados a apurar fatos atribuídos a 55 pessoas, das quais 49 eram titulares de foro por prerrogativa de função. A expectativa é de que a Lava-Jato tenha maior influência em grandes cidades. “Normalmente, as eleições municipais se concentram em temas locais. Os assuntos nacionais quase não aparecem. É mais provável que apareça com mais força nos grandes colégios”, atesta Barreto.
*Com APP/Ñotícias

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